Sobre a reportagem da Uol

| domingo, 23 de agosto de 2015
Nessa semana o site da UOL postou uma reportagem que gerou muita polêmica no meio cosplayer, intitulada "Cosplay: adolescente que se fantasia demais tem problema de identidade" na qual a edição e manipulação das entrevistas concedidas leva um leigo a acreditar que o hobby Cosplay provoca desvio de personalidade em adolescentes. Mas vamos lá mostrar que não passa de uma grande besteira.

Afinal, o que é o Transtorno Dissociativo de Personalidade?

Segundo o trecho extraído do site Psicósmica, "é um transtorno psíquico em que os indivíduos que dele sofrem apresentam aquilo que se costuma designar por personalidades múltiplas. Estas pessoas apresentam em contextos específicos estados de personalidade distintos, os quais assumem completamente o controle da situação. Pessoas que sofrem de Distúrbios Dissociativos "escapam" da realidade de modo involuntário e pouco saudável, perdendo a memória ou achando que são outra pessoa. Estes distúrbios costumam surgir como resposta a certos traumas, ansiedades ou lembranças muito dolorosas."

Em outras palavras, é um probleminha que algumas pessoas tem que elas num dado momento da vida acordam achando que são uma outra pessoa, se esquecem completamente de quem eram e vivem uma outra realidade, manifestando outras características de personalidade, que foi mais ou menos o que a senhoras falaram. Vamos ver de novo o que elas disseram (que foi claramente cortado):

GISLAINE DOMINICIS
psicanalista especialista em jovens

"O cosplay não favorece a integração, ele favorece a desintegração em no mínimo em dois, o eu que eu sou mesmo e o eu que eu represento ser"
"Então não é que eu represento o tal personagem , eu sou."
"O eu da pessoa tem que sumir pra vir esse outro eu, só que é uma relação positiva e de orgulho de ser o outro e não de ser a si mesmo, esse é que é o perigo"
"É um outro eu, a peruca tem que ser de outra cor, o olho tem que ser de outro jeito"
"O que liga é o ideal do ego, ne. Eu gostaria de ser essa pessoa poderosa que tem a vida nas próprias mãos. Nessa idealização eu me guio, eu mesmo sou uma porcaria, isso não ajuda minha auto estima a melhorar e nem ajuda a minha auto aceitação e nem ajuda também eu a caminhar e trabalhar pra chegar onde eu quero, porque não existe processo, eu me visto e já virei ele"
"Enquanto é o brincar, enquanto é o play, enquanto eu to brincando, é bom, positivo. Agora, quando vira a verdade ou quando eu acredito a verdade aí é negativo"
"Então é como se o personagem vai tomando conta da vida da pessoa"

LEDA ZANCANELLA
psicóloga especializada em adolescentes

"Ficar na fantasia é gostoso é cômodo"
"Ele pode passar a ter distúrbios graves ignorar a realidade"
"Sem dúvida vai ser uma invasão; aquilo que era segurança por ser um escudo se torna algo ao qual ele fica colado, aderido"
"Às vezes ele inventa um tipo, um falso 'eu' temporário"
"É uma mascara"
"Esse narcisismo fica altamente satisfeito porque ele tem ânsia de ser alguém, não alguém qualquer, alguém muito bacana"
"Esse que fixa isso como padrão e dá tchau pra realidade e fica vivendo de fato esse herói, ele não vai te responder eu sou fulano só no festival, ele vai te responder sempre"

Então, baseadas em conceitos que elas estudaram elas tentaram encaixar o cosplay no Transtorno Dissociativo de Personalidade. Só que não dá pra fazer isso. 

Para começar, não existe isso de eu visto e eu sou, a roupa não tá possuída pelo demônio que quando eu vestir vai passar o demônio pra mim. Não é assim. O mesmo sobre não ter processo. Tem processo pra caramba! A roupa não cai do céu. Você precisa pagar por ela e dinheiro também não cai do céu. Demanda muita pesquisa, planejamento. E alguns trajes pra vestir gasta horas! Eu pra me maquiar costumo gastar 40 minutos no mínimo. E mais, como eu mesma faço a minha roupa o processo ainda é mais demorado. Eu junto minhas moedinhas pra comprar o material, a peruca e acessórios como o sapato. Pesquiso preços, escolho, compro o tecido, planejo, pesquiso mais, desenho num jornal, monto a roupa numa boneca, testo pra ver se não vai dar ruim, e começo a cortar o tecido. Depois tem todo o processo de costura, acabamento, pintura, fazer artesanalmente e improvisando e reciclando com materiais de casa os acessórios. 

 Joaquina: a cobaia de cosplay
 
Dura meses e até anos pra ter o Cosplay completo. E porque demora tanto? Porque a minha vida não gira em torno da fantasia. Eu estudo, durmo, acordo, tomo banho, faço cocô, como, arrumo a casa, encontro as pessoas, converso, mexo no computador, cuido da minha irmãzinha. Eu vivo a minha vida de Jéssica que uma vez sim, por transtorno, eu quis não ter. Senta que lá vem a história.

Uma breve historinha de como o cosplay me ajudou a sair da depressão

Houve um período da minha vida que eu fiquei muito sobrecarregada com as situações que eu tinha que passar (que não quero entrar em detalhes) e eu entrei em depressão. Eu cheguei a pesar 38kg, com meus 1,61m de altura, minha pele teve um "colapso" e começou a descamar pelo corpo todo. Era bastante dolorido que as vezes sangrava a descamação, e eu me olhava no espelho e via um zumbi, me traumatizou bastante. Mas eu tratei e apele voltou ao normal deixando algumas manchas (que hoje em dia já estão bem claras). Tempo depois eu tive doença auto-imune do couro cabeludo, o que quer dizer que em várias partes do meu couro cabeludo meu cabelo simplesmente foi rejeitado e soltou, deixando uma careca bem louca no alto da minha cabeça. Com os cabelos que sobraram eu parecia o Paulinho Serra. 

E com isso a minha auto-imagem tava destruída, como eu tava depressiva tudo virava uma bola de neve e me fazia eu me sentir um lixo e querer morrer. Mas onde que o cosplay entra nisso? Como eu tava meio sem cabelo e me sentindo horrível, quando eu já tava recuperando um pouco a vontade de seguir em frente, as perucas que eu tinha eram tipo um "nooosssaa" na minha vida. Escondia a careca e eu me sentia sensacional. Várias cores, macias e bonitas contornando o meu rosto e me fazendo me sentir melhor e mais bonita. A maquiagem também, e a roupa então, opa! To gata! E como minha autoestima e minha confiança tava lá em cima por estar trajando a minha obra de arte que fiz com muito esforço eu fiz muitos amigos, me soltei, falei de coisas de mim que eu escondia. Foi ótimo pra me fazer manifestar a MINHA personalidade. Na verdade eu nunca entrei na personalidade do personagem, eu nunca consegui ser nenhum deles, só me vestir como eles. Sempre eu estava sendo eu. Conversando com as outras pessoas no evento eu falava sobre mim e sobre o personagem que vestia, pedia comida, bebia água, tinha que fazer malabarismo pra usar o banheiro, mas nunca deixei de ser eu.


 (Eu maquiando o amiguinho)
 
(Eu lanchando - td mundo tem suas necessidades fisiológicas kk mas não tem foto no banheiro, relaxa aí)
 
Outra coisa que gostaria de abordar, eu faço cosplay de multiplos personagens, cada um tem um tipo de personalidade, que eu posso até listar aqui: A Zelda é uma princesa séria e responsável, poderosa e sábia. O Alois é um menino inconsequente e imaturo em busca de vingança. A Virgo é um espírito estrelar bastante inexpressivo. A Jessie Rocket é gananciosa, atrapalhada... E vários outros. Alice tem distúrbio mesmo, admito. E como eu sou, sei lá, me conheça e me conta depois, to com preguiça.
 
*Pausa. Mas estou falando de mim, se você realmente acredita ser o personagem como o Inri Cristo acha que ele é Jesus, cuidado, leia isso aqui e procure ajuda, rápido rs
*Outra coisa, não ache que você é uma porcaria sem cosplay como disseram na reportagem lá, seja uma pessoa legal o tempo todo e tenha consciência disso, isso que é ter auto estima.

Onde eu quero chegar com isso tudo é que Cosplay é maravilhoso, é um hobby pra manifestar todo seu potencial artístico escondido. Você pode aprender a costurar, orçar, modelar, posar para fotos, editar fotos, tirar fotos, customizar roupas, perucas, cuidar de cabelo sintético, maquiagem, andar em salto alto (essa eu não aprendi, sou uma negação, caio mesmo), decorar texto, gravar e editar áudio, vídeo, interpretar, competir e compartilhar experiências. Ao contrário do que a senhorinha disse, o cosplay pode te ajudar a trabalhar várias habilidades pra alcançar um objetivo. Não caia no conto de que você vai ficar doido tentando jogar poder na cara dos outros na rua. A menos que você tenha problema ele não vai surgir porque está se fantasiando em eventos e sessões de fotografia.

Então é isso, divirta-se sem amarras, seja quem você é em todas as dimensões. #Cosplaynãoédistúrbio Enjoy a vida <3

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